segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Campo perde mão de obra para construção civil

Falta de trabalhadores eleva custos e preocupa produtores brasileiros de hortaliças

Danielle Assalve, da Califórnia (EUA) | 29/08/2011 05:35

A escassez de mão de obra no campo é a principal preocupação dos produtores brasileiros de hortaliças. Com a economia ainda aquecida, trabalhadores têm trocado lavouras por empregos nas cidades grandes, principalmente na construção civil e em outros setores da indústria.

“O problema é muito sério. Estamos perdendo funcionários antigos e está mais difícil encontrar outras pessoas para contratar”, diz Alberto Seguchi, produtor de alface em Mogi das Cruzes, no Estado de São Paulo.

Ele afirma que a situação se agravou a partir do ano passado. “Antes tanta gente ia pedir emprego no campo que eu tinha que recusar”, diz. “O pessoal ficava esperando surgir uma vaga. Agora sou eu que espero aparecer alguém disposto a trabalhar.”


Foto: Danielle Assalve/iG Ampliar
Alberto Seguchi, produtor de Mogi das Cruzes (SP): "está mais difícil encontrar pessoas para contratar"
O cenário é familiar para outros agricultores que participaram de uma visita técnica organizada pela Seminis, divisão de hortaliças da Monsanto, a áreas de produção na Califórnia, na costa oeste dos Estados Unidos.
Henry Horita, que também tem plantação de hortaliças na região de Mogi, perdeu quase 30% dos funcionários desde dezembro. “No fim do ano passado, tinha 60 pessoas trabalhando comigo. Agora tenho 40”, afirma. Ele conta que não foi por falta de esforço. “Você pode oferecer salário maior, benefícios, mas quando a pessoa quer deixar o campo, não tem jeito. É um problema que está acontecendo com praticamente todos os produtores.”

Situação semelhante foi vivida nos Estados Unidos durante boa parte dos anos 2000. “Há uns oito anos, a economia estava melhor e muitos trabalhadores deixavam o campo para trabalhar na cidade, especialmente na construção. Mas a crise econômica diminuiu muito as oportunidades nos centros urbanos”, diz Christopher Waldron, gerente da Plantel Nurseries, empresa especializada na produção de mudas de hortaliças na Califórnia. Hoje, o país continua a sofrer com a falta de trabalhadores para a agricultura, mas o motivo agora é outro: a crise econômica.


Custos pressionam produção

 
Para tentar reter mão de obra, alguns produtores brasileiros oferecem aos funcionários participação nos lucros. “É uma alternativa, especialmente quando já se investiu em treinamento para uma função mais específica, que tem um papel fundamental dentro do processo produtivo”, diz Ricardo Mikami, que trabalha com a criação de mudas de hortaliças e revenda de insumos agrícolas na região de Campinas (SP). “Mas ainda assim tem gente que não fica mais no campo. Isso gera muita preocupação sobre o futuro da agricultura”, afirma.

A falta de funcionários contribui para elevar os salários dos que continuam nas lavouras. “Hoje a primeira pergunta que fazem quando você oferece uma vaga é: ‘Quanto o senhor vai pagar?’ Se não for um valor bom, é difícil conseguir alguém”, diz Seguchi.


Com o aumento dos custos trabalhistas e menos gente no campo, a produção tem diminuído – e isso em um cenário favorável para o consumo de hortaliças que, embora ainda tímido, segue em crescimento no Brasil. 
A saída, segundo produtores, é ampliar ao máximo a mecanização das lavouras. Mas ao contrário do que ocorre na Califórnia, o clima e o relevo no "cinturão verde" de São Paulo – principal região produtora de hortaliças do Brasil – não favorecem o uso de máquinas. E o custo dos equipamentos ainda é bastante elevado.


Causas

Na avaliação dos produtores, um dos motivos que ajuda a explicar a falta de mão de obra no campo é a exposição às intempéries nas lavouras. “Muitas pessoas aceitam ir para a cidade mesmo com um salário menor e tendo custo de vida mais alto por causa das próprias condições do campo”, diz Ricardo de Paula, produtor de mudas de hortaliças na região de Ribeirão Preto, interior de São Paulo. “Na indústria não tem chuva, sol e frio, mas na lavoura você não tem como fugir disso. Faz parte do dia-a-dia”, acrescenta.

O preconceito também pesa na decisão de deixar a agricultura para trás, aponta Seguchi. “Há uma questão ligada ao status de estar na cidade grande, de não querer se sentir ‘caipira’. Mas a vida nos centros nem sempre é tão fácil”, diz. Segundo ele, houve casos em que funcionários voltaram à lavoura após uma temporada na cidade. “A maioria tem ido trabalhar na construção civil. Mas geralmente os custos de vida são bem maiores que no campo e os contratos de trabalho são temporários, para construir um prédio, por exemplo. E depois que termina a obra, ele vai fazer o quê?”


Ainda nesta reportagem:
A repórter viajou a convite da Monsanto.

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