segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Pires: “Mercado aposta em rebaixamento de nota da Petrobras”

O mercado financeiro acorda hoje arisco com as ações da Petrobras.


Durante todo o fim de semana, depois de a empresa anunciar prejuízo de R$ 1,3 bilhão no segundo trimestre, contra um lucro líquido de R$ 10,9 nos primeiros meses do ano, os analistas estão atentos para a possibilidade de agências de classificação de risco reduzirem a nota de crédito (ratting) da empresa ainda hoje. “Isso encareceria o crédito para a empresa financiar a exploração do pré-sal. A situação é perigosa”, alerta Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE) e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Em entrevista ao Poder Econômico, Pires analisou a situação da empresa.



Poder Econômico – No primeiro trimestre, o lucro da Petrobras já havia caído 16,1% devido ao câmbio e, principalmente, à defasagem de preços. Acredita que esse sinal foi ignorado?

Adriano Pires – A explicação para o prejuízo tem que ser buscada mais atrás. O câmbio ajudou, a defasagem de preço interno com o externo, ajudaram no resulta negativo. Uma empresa de petróleo de capital aberto administrada de forma correta do ponto de vista empresarial tem que repassar seus custos. O lucro deveria cair, sim, como caiu o da Shell, por exemplo, e de outras concorrentes porque o preço do barril caiu. A Shell teve resultado 50% menor. Mas a explicação para o prejuízo está na opção feita há nove anos. A explicação é bem diferente de 1999, quando passamos por uma maxidesvalorização, um choque na moeda. Algo imprevisto e repentino. No setor de petróleo, em 1999, o barril estava abaixo de 20 dólares, foi o segundo ano de quebra do monopólio, não tinha pré-sal. Não havia expectativa que tem hoje. Mas como uma empresa com a tecnologia, know how e com reservas maiores do que suas concorrentes (com o pré-sal), com barril próximo de 100 dólares pode ter prejuízo. A explicação está lá atrás muito além do primeiro trimestre deste ano.



Poder Econômico – Qual a explicação?

Adriano Pires - A Petrobras começou a ser desconstruída no dia 1º de janeiro de 2003, quando o ex-presidente Lula chega ao poder e tem seu segundo movimento perverso em 2008, com o pré-sal. A partir do governo de Lula, a Petrobras foi usada da pior maneira possível. Primeiro, como instrumento de política econômica para combater a inflação, ampliando a importação de gasolina e diesel sem equiparação de preços internos e externos. E aí começou a destruir o programa de etanol. Depois como instrumento de política industrial ao exigir um elevado e irreal conteúdo local e provocou atraso em equipamentos e isso estagnou o volume de produção nos últimos quatro anos. Nem as metas mais conservadoras foram atingidas. Em terceiro, vem o instrumento político. Investimentos no Maranhão, Ceará, Pernambuco para atender a critérios políticos sem nenhum controle técnico. Sem projeto bem feito. A refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco, vai custar dez vezes mais do que o previsto. Assim como a Comperj [o maior complexo Petroquímico do Rio de Janeiro]. A eficiência operacional da empresa foi embora. A própria Graça Foster anuncio investimentos de 5 a 6 bilhões de reais para, segundo ele, recuperar a eficiência da Petrobras.



Poder Econômico – Com esse resultado do segundo trimestre, aposta que Graça Foster pode ganhar força na equipe econômica para aumentar os preços dos combustíveis?

Adriano Pires – Espero que sim. Esse pode ser o grande benefício que esse prejuízo vergonhoso pode trazer a curto prazo. A gente torce por isso. Ninguém é contra a Petrobras. Quem foi contra a Petrobras foi o governo Lula com a crítica de que os adversários do PSDB pretendiam privatizá-la e um discurso nacionalista. Agora quem colocou sua aposentadoria, seu FGTS na Petrobras está sentido os efeitos. O melhor investimento do mundo é empresa petrolífera, como se diz, o segundo é numa empresa petrolífera mal administrada e o terceiro virou a Petrobras. Está abaixo de todas as expectativas. Chegou no limite de sua saúde financeira e de caixa por ter sido usada como instrumento político, econômico e partidário.



Poder Econômico – Qual seria o percentual de reajuste hoje para equilibrar os preços internos e externos?

Adriano Pires – Gasolina e diesel em torno de 15% para cada produto. Em ano eleitoral, isso é bastante difícil. Agora a Petrobras vai ter que torcer para que o real se valorize e o preço do barril do petróleo suba. Ou seja, vai ter que torcer contra a economia brasileira. É paradoxal. Gasolina e diesel respondem por 65% a 70% da receita da Petrobras. A empresa importa gasolina a 1,68 real por litro e vende a 1,40. Perde cerca de 48 centavos por litro importado. Isso quer dizer que quanto mais a Petrobras vende seu principal produto mais aumenta seu prejuízo. Nunca vi isso.



Poder EconômicoComo vê a expectativa do mercado para esses próximos trimestres?

Adriano Pires – O futuro da Petrobras, caso o governo não reajuste preços, dependerá somente do mercado. Dependerá de câmbio e preço do barril, como disse, duas variáveis independentes da gestão. Nem precisaria ter presidente na Petrobras. A Graça Foster só terá condições de melhorar a gestão se o governo lhe oferecer essas condições. A área de abastecimento registrou prejuízo de quase 11 bilhões de reais do fim do ano para cá. Se o governo não entender isso, a Graça não pode fazer nada. Ela está consciente, por suas declarações, da situação caótica da empresa. Já disse que só haverá recuperação em 2014. Esse ano e no próximo, segundo a própria Graça, a produção está estagnada. Se o governo não ajudar a Graça sua gestão corre o risco de ser tão irrealista quanto foi a de José Sérgio Gabrielli.



Poder Econômico – Qual a consequência imediata para os acionistas?

Adriano Pires – É ruim. O mercado teme que alguma agência de risco divulgue, talvez já nesta segunda, um down grade na avaliação de risco da Petrobras. Isso encareceria o crédito para a empresa financiar a exploração do pré-sal. A situação é perigosa. A empresa vive exatamente o inverso de todo aquele discurso feito em 2008 e 2009 com o pré-sal. A produção da Petrobras representava 3% do PIB em 1998, chegou a 12% em 2006 e parou. Era para estar em 20%. Se houver realmente o down grade, como o mercado especula, ocorrerá o que ocorreu com a OGX do Eike Batista. O mercado não paga para ver. O Eike emitiu títulos sem produzir nenhum barril. Deu no que deu.



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FONTE: IG COLUNISTAS - PODER ECONOMICO

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