quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

FERRARI DA PORCELANA A VENDA


'Ferrari da porcelana'

Fábrica falida luta para encontrar comprador





"Ferrari da porcelana" luta para encontrar comprador

Custos trabalhistas e os impostos elevados da Itália a deixaram a empresa familiar numa desvantagem nítida diante da concorrência de produtos baratos vindos da China

NYT- Elisabetta Povoledo |


NYT


Durante quase 300 anos, a fábrica Richard Ginori, instalada nesta cidade toscana, produziu singulares utensílios para mesa de porcelana, artesanais e decorados com elegância. Suas peças enfeitaram museus e as mesas dos ricos e da aspirante classe média do mundo inteiro. Em março, o Palácio Pitti, em Florença, vai exibir porcelana Ginori da época da ocupação napoleônica da Toscana.

Entretanto, tudo isso pouco consola os mais de 300 empregados da fábrica sujeitos ao desemprego. Após anos de resultados cambaleantes, a fábrica foi declarada falida em janeiro.
 
Numa recente manhã gelada, os funcionários se agruparam na entrada, esperando um novo proprietário que poderia salvar a empresa e preservar o coração desta cidade, confortavelmente grudada em Florença, onde toda família está ligada à fábrica de um jeito ou de outro.
 
"Existem leis para salvar os pandas", afirmou Valentina Puggelli, funcionária do departamento de comunicação da empresa. "Nós queremos salvar algo igualmente raro."


Como uma companhia fundada em 1735 e que suportou revoluções na indústria e nos gostos populares pode falir é tema de um debate considerável por aqui. As respostas dizem tanto a respeito do fim da Richard Ginori quanto das forças maiores que brigam praticamente contra todos os fabricantes italianos pequenos e médios numa época de competição global acentuada e crise econômica doméstica.
 
Os jantares formais estão morrendo paulatinamente e, com eles, o mercado da porcelana feita à mão, que é meticulosamente lenta e cara de produzir. A exemplo de tantas indústrias italianas de tamanho similar, a empresa enfrentou a escolha entre tentar preservar seu status – e mercado – como um produto de nicho sofisticado com a distinção de um "Made in Italy" ou explorar os gostos menos caros e genéricos do mercado global.

A fabricante optou pela segunda opção e passou a produzir artigos do dia a dia – incluindo utensílios de mesa para um brinde promocional de uma cadeia de supermercados –, colocando a empresa em concorrência direta com cerâmicas mais corriqueiras. Contudo, os altos custos trabalhistas e os impostos elevados da Itália a deixaram numa desvantagem nítida. Para muitos empregados, essa decisão leva a culpa pelo declínio da firma.

"A Richard Ginori tem de capitalizar sua alta qualidade", disse Giovanni Nencini, empregado e porta-voz do sindicato Cobas. "Nós somos a Ferrari da porcelana, mas os planos estratégicos dos últimos anos rebaixaram a qualidade da marca."

Por certo, a Richard Ginori não era a única a sofrer pressão. Tem sido uma época difícil para fabricantes de porcelana do mundo inteiro. Muitas marcas célebres – Wedgwood, Spode, Rosenthal – também não foram capazes de sobreviver num mercado inundado por utensílios de mesa funcionais e baratos, geralmente vindos da China, a criadora da cerâmica com corpo de argila branca 1.500 anos atrás.

Agora, os italianos compram cerca de 60 por cento dos utensílios de mesa da China, segundo a Confindustria Ceramica, o lobby comercial que representa 273 ceramistas italianos e seus 37 mil trabalhadores. Nos últimos meses, a associação acusou os chineses de dumping no mercado italiano, oferecendo produtos abaixo do custo de fabricação, levando a Comissão Europeia a cobrar impostos de importação – por ora, temporariamente – de até 59 por cento sobre alguns utensílios de mesa da China.

de alguns proprietários anteriores de recuperar a Richard Ginori e trazer designers de ponta, como Paola Navone, a atual diretora artística, o investimento, segundo críticos, foi insuficiente e o clima empresarial da Itália deixou a empresa capenga.

Agora, os empregados fantasiam que um novo dono trará "a mesma iluminação e coração", disse Letizia Filippini, decoradora.

Carlo Ginori, marquês florentino, abriu a fábrica original nesta cidade em 1735 após explorar a Toscana em busca de caulim, a argila branca que é o ingrediente essencial da porcelana.

O negócio floresceu e permaneceu na família até sua fusão com a Società Ceramica Richard, de Milão, em 1896, quando então se transformou na Richard Ginori. Naquela época, a empresa personalizava tudo, de utensílios de mesa para navios de luxo luxuosos a louça para hotéis de luxo e o Vaticano. Na década de 1930, ela empregava dois mil funcionários, executando as visões de Gio Ponti, um dos designers e arquitetos mais renomados da Itália.

Segundo muitos nesta cidade afirmam, o começo do fim foi 40 anos atrás, quando a fábrica se tornou apenas mais um ativo na carteira de investimentos de uma série de empresas italianas. Por fim, em maio do ano passado, os acionistas resolveram salvar-se a tempo – as dívidas somavam 75 milhões de euros – e votaram pelo fechamento.

Em novembro, liquidantes apontados pela justiça encontraram um comprador: uma joint venture entre a Lenox, empresa norte-americana de utensílios para mesa e artigos para presente, e a Apulum, produtora de cerâmica romena. Juntas, elas prometeram comprar a companhia por 13 milhões de euros, manter 90 por cento da mão de obra e investir na marca.

Como parte do acordo, o governo italiano aceitou provisoriamente renunciar a impostos atrasados em troca da propriedade do Museu Richard Ginori, próximo à fábrica e que abriga muitos milhões de euros em produtos.

Porém, o acordo fracassou depois que um tribunal florentino levantou preocupações concernentes a parte dos aspectos jurídicos. Os liquidantes têm até meados de maio para encontrar um comprador, o qual deve recomeçar a marca, reestruturar as cadeias de produção e reformar a fábrica enquanto protege os trabalhadores. Lenox e Apulum afirmaram estar preparando outra oferta conjunta.

"Continuamos comprometidos em investir na marca e manter a fábrica em Sesto Fiorentino; isso é parte integrante do nosso plano", disse William Robedee, diretor jurídico da Lenox. "A habilidade manual italiana é o DNA do negócio, é o que o torna tão atraente."

A cidade de Sesto Fiorentino pouco pode fazer para determinar o que acontecerá com a fábrica, mas o prefeito, Gianni Gianassi, insiste que ela deve continuar aqui.

"Capital estrangeiro é bem-vindo, mas as cabeças e as mãos da fábrica devem permanecer toscanas."
Enquanto isso, os empregados da fábrica choramingam em frente ao portão principal, onde cartazes pedem solidariedade e uma solução satisfatória para a fábrica. Mauro Poggiali, com 35 anos de casa, estudava um cronograma para atender pedidos em aberto do Japão, encomendados quando a fábrica estava fechada. Segundo ele, sua equipe levaria cerca de cinco dias para fabricar 11 mil peças.

"Nós somos bons. Não somos da Ginori à toa", afirmou.

FONTE: IG ECONOMIA

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