quinta-feira, 18 de abril de 2013

Economistas dizem quem pisou no tomate

Depois da alta da taxa básica de juros, especialistas explicam como o mercado financeiro pode pegar carona na alta da fruta



Paula Pacheco- iG São Paulo | - Atualizada às

Divulgação
O mercado se inspira em um filme trash e escolhe o tomate como vilão

Nas últimas semanas, o tomate passou de principal acompanhamento dos pratos de espaguete a munição nas mãos da oposição e de boa parte do mercado financeiro. Ambos acusam o governo de não ter o controle necessário sobre a inflação.

O tomate foi escolhido para sustentar a tese porque teve um alta de 122,13% nos últimos 12 meses. “Dilma pisou no tomate”, “O governo pisou no tomate”, “O tomate ameaça a reeleição de Dilma” são alguns dos atos e ameaças sombrios de um país em descontrole, desenhados por analistas do mercado financeiro e fartamente ouvidos pela mídia brasileira e estrangeira.


- Preço do tomate cai 75% em três semanas


Para o mercado, a disparada do preço da fruta e seu reflexo na inflação oficial foram o pretexto necessário para amplificar o discurso pela elevação da Selic – a taxa básica de juros. A pressão ecoou. Na noite da quarta-feira (17), o Comitê de Política Monetária (Copom) anunciou que a Selic passa de 7,25% ao ano para 7,50%. A última alta da taxa básica de juros ocorreu em julho de 2011 e deixou saudade nos investidores, agentes do mercado financeiro e oposição ao governo da presidente Dilma Rousseff.

Na batalha da comunicação quando o assunto são os juros e a inflação, eles buscam puxar o
pêndulo para a “gravidade” da situação econômica ou inflacionária: uma banda deseja juros altos
para ganhar financeiramente; a outra, para obter dividendos políticos. Por um lado, quanto mais
altos os juros, mais os agentes financeiros engordam seus ganhos em papéis. Já a oposição ao
governo optou por utilizar um produto corriqueiro da vida do brasileiro para tentar ganhar adeptos ao discurso crítico à política econômica.

Para economistas de fora do mercado financeiro, foi este grupo que pisou no tomate nas
últimas semanas. Eles explicam até que ponto o preço do tomate representa um risco ao modelo
econômico do País e é uma ameaça ao bolso do brasileiro. É fato que a inflação está acima
do desejado, concordam. Mas os dados mais recentes, referentes a março, mostraram uma
desaceleração, inclusive do grupo de alimentos, do qual faz parte o famigerado tomate. Em março, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) teve uma variação de 0,47% – inferior ao
registrado no mês anterior, de 0,60%. Portanto, a previsão é que a inflação siga em trajetória de
queda.



Tendência de queda

Segundo o IBGE, responsável pelo levantamento do IPCA, a taxa de março é a menor desde
agosto de 2012 , quando ficou em 0,41%. "Se isso persistir pelos próximos meses, pelo menos até o meio do ano, já podemos apontar como uma tendência de queda da inflação", diz Julio Sérgio Gomes de Almeida, economista, professor da Unicamp e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda.

Para Almeida, o governo não descuidou da inflação, pressionada em grande parte pela alta
dos alimentos – reflexo de fatores como problemas climáticos e o aumento da cotação das
commodities agrícolas. "Poderia haver preocupação se a inflação fosse resultado de um consumo muito aquecido, mas não é o caso. O problema está localizado no preço dos alimentos. No entanto, tudo isso serviu de brecha para os ataques à política econômica, em muitos casos
promovidos por pessoas que fizeram parte do governo no passado, que ficaram de fora do discurso atual e que buscam uma revanche".



Questão de jeito

O economista recomenda ao Banco Central "menos força e mais jeito". "Exagerar no aumento da
taxa de juros pode acentuar a expectativa de que a inflação poderá continuar. É preciso cautela. O BC tem apenas de mostrar que está atento ao processo", sugere Almeida.

Segundo o sistema de meta de inflação em vigor no País, o IPCA em 2013 deverá ser de 4,5%,
com uma tolerância de dois pontos percentuais – para cima ou para baixo. Ou seja, o IPCA pode
ficar entre 2,5% e 6,5%. Antes mesmo de o Copom aumentar os juros sob a justificativa de
combater a inflação, o próprio mercado financeiro, por meio da pesquisa semanal Focus, feita pelo BC, mostrava confiança no cumprimento da meta. A estimativa para o IPCA em 2013 caiu em
uma semana de 5,70% para 5,68% – portanto, dentro do projetado pelo governo.

Luiz Gonzaga Belluzzo, professor da Unicamp e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, é categórico ao avaliar a onda alarmista: "o mercado financeiro se divide entre vendidos e comprados, não há opinião independente. É impossível levar a sério essas opiniões porque os interesses são muito claros. Por isso o Banco Central não pode atuar carregado pelas conveniências do mercado financeiro, não pode ficar submergido nessa maré de opiniões".

Para Belluzzo, o mais importante na decisão de aumentar a Selic foi o recado dado ao mercado de que o governo monitora de perto a inflação e tem o controle da situação. "Não dá para o País ser um samba de uma nota só, onde só o mercado financeiro fala. Muitos deles [do mercado financeiro] estiveram lá e não botaram a inflação na meta", critica o especialista.

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Do mesmo jeito que disparou, o preço do tomate entrou em fase de queda

Embora a inflação tenha superado de leve o limite de alta da meta inflacionária, há um conjunto de sinais que informam ao país uma economia a meia trava e outro mostrando distensão nos fatores principais de pressão sobre os preços. A boa notícia vem da própria queda de venda dos supermercados: os grandes fabricantes de produtos de varejo, que reajustaram seus preços nos últimos meses, sofreram queda significativa de vendas. Mais: na quarta-feira (17), o preço do tomate já mostrava redução de 75% em relação a três semanas atrás e virou alvo de promoções em duas grandes redes. Mas o coro prosseguiu.

João Sicsú, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e ex-diretor do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), lembra que a alta da Selic, sozinha, não garante o controle inflacionário, e diz que a responsabilidade não deve ser apenas do BC. "A responsabilidade é de todo o governo, que deve agir na coordenação entre diferentes órgãos e políticas para que haja estabilidade macroeconômica, com controle da inflação, crescimento econômico, geração de emprego e de renda", afirma.

Sicsú cita como exemplo de ação antiinflacionária a recente decisão do governo de cortar os
impostos federais que incidem sobre os produtos da cesta básica. A expectativa da presidente
Dilma Rousseff era de que os cortes fossem repassados integralmente pelo varejo para o preço
final cobrado do consumidor, o que até agora não ocorreu. "Não acredito no repasse total para o
preço. Os empresários brasileiros têm uma gana grande por margem de lucro. Nesse caso, o que
houve foi que os empresários resolveram embolsar parte do corte de imposto", opina. A quem
acredita que a presidente errou, ele manda o recado: "Vivemos uma economia de mercado. O que esperavam, uma intervenção do governo nos preços cobrados pelo varejo?", provoca



Teorias

No meio do debate sobre o momento econômico, surgiram avaliações sui generis, como a
que compara o cenário inflacionário do País com o da Argentina (que terminou 2012 na casa dos
30% no ano), que há tempos perdeu o rumo e a credibilidade sob a acusação de maquiagem de
dados oficiais.

Outros recorreram à memória do economista americano Milton Friedman, nome expoente da
economia liberal dos anos 1970, e reduziram o combate à inflação à seguinte receita: controle do
dinheiro em circulação. Sicsú analisa o discurso: "muitos bancos centrais adotaram essa fórmula
nos anos 1970 e 1980, como o americano e o inglês, mas é um modelo superado, pouco eficaz
para conter a inflação. É básico e ultrapassado, ensinado em algumas faculdades de economia às turmas do primeiro ano".

FONTE: IG ECONOMIA

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