Imagine que eu lhe entregue uma caixa de fósforos e lhe peça para avaliar o valor que ela tem para você. 

Se você estiver dentro de uma sala completamente escura, com certeza vai valorizar mais a caixa do que se recebê-la se estiver em um local aberto e bem iluminado. 



Assim como o contexto é fundamental para o valor atribuído a uma caixa de fósforo, sua percepção de valor para uma mesma quantia em dinheiro varia muito de acordo com o contexto em que se encontrar. 



O economista Sendhil Mullainathan e o psicólogo Eldar Shafir, autores do livro Escassez, relembram, por exemplo, um estudo que mostra um comportamento diferente das pessoas em duas situações em que havia a possibilidade de economizar US$ 35. 


Na primeira situação, quando um DVD era encontrado por US$ 100 em uma loja e por US$ 65 em outra loja a 30 minutos de distância, as pessoas se mostraram mais dispostas a se deslocaram para a loja mais distante para economizar. 

No entanto, diante do mesmo exemplo, porém com um notebook de US$ 1 mil em uma loja e US$ 965 em outra, as pessoas desistem do deslocamento e se dispõem a pagar a diferença de US$ 35. 



A diferença de percepção de valor desafia as premissas da economia tradicional, a qual acredita que a taxa de troca entre tempo e dinheiro deve ser constante. 

Essa variação mostra que nossas decisões financeiras, por diversas vezes, escapam da racionalidade. 


Os autores destacam uma conclusão preocupante diante da nossa relatividade na percepção de valor. 



Acabamos desperdiçando muito dinheiro em situações em que deveríamos nos preocupar em economizar. 


Podemos passar horas pesquisando preços de um sapato na internet para economizar R$ 50, mas não nos importamos em pagar R$ 1 mil a mais em um carro por não pesquisarmos e negociamos o preço em muitas concessionárias. 

Os autores notaram uma variação interessante na percepção de valores. 

Diante da escassez, o comportamento das pessoas muda drasticamente. 

Os especialistas fizeram simulações parecidas com o caso do DVD e do notebook com pessoas de classes sociais diferentes. 

Na primeira simulação, a pessoa precisava comprar um aparelho e o encontrava por US$ 100 em uma loja, mas ficava sabendo de outra em que o produto custava US$ 50 menos. 

A mesma simulação era apresentada em outros dois formatos: a segunda com o produto custando US$ 500 em uma loja e US$ 450 em outra; e a terceira com o aparelho custando US$ 1 mil em uma loja e US$ 950 em outra. Ou seja, em todas as situações, a economia seria de US$ 50. 


Quando as simulações foram apresentadas a pessoas com alto poder aquisitivo, os resultados foram compatíveis com o que já havia sido demonstrado na experiência original: 

- 54% economizaram na simulação de US$ 100; 
- 39% economizaram no caso de US$ 500 

e, por fim, 

- somente 17% economizaram na simulação de US$ 1 mil. 



Com os pobres, no entanto, os resultados foram bem distintos: 

- 76% economizaram na simulação de US$ 100; 
- 73% economizaram no caso de US$ 500 

e, surpreendentemente, 

- 87% economizaram na situação de US$ 1 mil. 



Os pesquisadores concluíram que a diferença se deu porque a classe mais pobre percebe a importância de economizar quando se gasta tanto. 


O resultado do experimento tem aplicação direta na realidade. 

Os autores destacam, por exemplo, resultados apontados em pesquisas feitas por profissionais de marketing em portas de supermercados. 

Abordados para responder perguntas sobre preços de produtos, os ricos dificilmente se lembravam do valor exato de itens que tinham acabado de colocar no carrinho. 



Os pobres, em contrapartida, sabiam com mais precisão o quanto haviam pagado por cada produto. 


Eles mencionam ainda um estudo que demonstrou que as embalagens econômicas enganosas tinham mais chances de serem consumidas em supermercados voltados para um público mais abastado do que em supermercados voltados para as classes mais pobres. 

A atenção aos preços diante da escassez de dinheiro no orçamento torna os pobres menos susceptíveis a esse tipo de armadilha. 

O valor atribuído a algo vai muito além do que enxergamos na etiqueta de um produto. 

Vale a reflexão sobre o que colocamos de pano de fundo para economizar em algumas situações e não dar o mesmo valor para essa economia em outros contextos.



AUTOR:
  • Samy Dana

    Possui Graduação e Mestrado em Economia, Doutorado em Administração e Ph.D in Business. É professor de carreira na Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas.